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Modelo Pedagógico Virtual: Filosofia Educacional e Princípios de Aprendizagem

Legenda

A dotando a definição de modelo pedagógico como uma construção que procura representar uma visão de aprendizagem, e assumindo a necessidade de definir procedimentos didáticos e um quadro de referência, a seguir apresentam-se as linhas de força e os princípios teóricos do modelo pedagógico para a educação aberta e digital da UFRB, que se assenta em cinco pilares: aprendizagem de natureza humanista, centrada no desenvolvimento de competências e promotora de multiletramentos, construtivista, colaborativa e investigativa alicerçada em comunidades virtuais e nos princípios da flexibilidade, da interação, e da inclusão digital.

Alguns destes pilares e princípios também norteiam a Universidade Aberta de Portugal, instituição pública que mantém convênio de cooperação técnica com a UFRB. Entretanto, ressaltamos que tais princípios foram contextualizados com a realidade técnica, didática e pedagógica da educação aberta e digital da UFRB.

Aprendizagem de natureza humanista centrada no desenvolvimento de competências e promotora multiletramentos

Considerando-se a abordagem sociointeracionista, o ser humano é o resultado de suas diversas interações no seu contexto social e cultural. Vygotsky (2007) nos apresenta o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) como sendo a distância entre o espaço em que o estudante consegue compreender, ou realizar sozinho (zona de conhecimento real), e o nível que poderá alcançar com a mediação de uma pessoa mais experiente (zona de conhecimento potencial).

Destacamos que a ZDP se constitui no espaço de mediação pedagógica dos professores e tutores no processo de construção do conhecimento, como esclarece Preti (2009), e pressupõe a realização de tarefas ou atividades que os estudantes necessitam realizar com o apoio do professor e tutores, quais \emph{scaffoldings} (andaimes), no dizer de Wood, Bruner e Ross (1976).

Nesta perspectiva, o estudante ocupa um lugar central no modelo, como um indivíduo ativo, capaz de construir conhecimentos, empenhado e comprometido com sua autoaprendizagem e, sobretudo, integrado a uma comunidade de aprendizagem.

Considerando-se este pressuposto, as situações de ensino devem ser planejadas em função de um roteiro de aprendizagem que possa conduzir os estudantes ao desenvolvimento tanto das competências específicas à área do curso, como das competências transversais necessárias à sociedade do conhecimento, às competências chave que os estudantes devem possuir para ter sucesso no mundo de hoje e de amanhã, quer ingressem no mundo do trabalho e optem por uma carreira profissional, quer como elementos críticos e intervenientes nesta sociedade digital e em rede.

Com efeito, hoje em dia, para se conseguir ser bem-sucedido, numa economia suportada pela inovação, os cidadãos precisam de um conjunto diferente de competências, como a colaboração, a criatividade ou a capacidade de resolução de problemas, para além de qualidades ao nível do caráter como persistência, curiosidade e iniciativa. Vários estudos internacionais, como o Partnerships for the 21st Century Skills (P21)\footnote{Disponível em: \url{https://www.21stcenturyskills.org}} e o estudo da \emph{Rede Europeia de Políticas sobre as Competências Essenciais na Educação Escolar} (KeyCoNet)\footnote{Disponível em: \url{https://www.keyconet.eun.org}}, apontam para domínios comuns, como as Competências Comunicacionais, referentes à capacidade de comunicação oral e escrita, de literacia para as tecnologias e para os média; as Competências de Raciocínio e Resolução de Problemas e as Competências Interpessoais e de Autodirecionamento, referentes à colaboração e trabalho em equipe, à sensibilidade e responsabilidade social, à adaptação e flexibilidade, à curiosidade e criatividade e, finalmente, à autonomia e iniciativa.

Assim, se por um lado, o estudante, enquanto indivíduo ativo, construtor do seu conhecimento, empenhando-se e comprometendo-se com o seu processo de aprendizagem e integrado numa comunidade, assume o papel de elemento central da experiência educacional, por outro, o professor, assume-se como um elemento nuclear, como um e-moderador (SALMON, 2000), que tem de guiar essa experiência educacional, que deve acompanhar, motivar, dialogar, ser líder e mediador, fomentando e mediando uma interação humana positiva. Espera-se, pois, que seja moderador nas relações interpessoais e intrapessoais e faça o seu papel de auto e heteroavaliador, de conteúdos e desempenhos. Espera-se também que sirva de suporte e estímulo aos estudantes, regulando e orientando as suas emoções, afetos e atitudes.

Para além disso, o modelo preconiza também uma aprendizagem \emph{promotora dos multiletramentos.} Multiletramento entendido como a necessidade de desenvolver nos estudantes novas competências de análise discursiva, a ponto de os capacitar a transmitirem e representarem o seu mundo através de modelos ou novos formatos multimodais. O desenho multimodal situa-nos num paradigma interdependente, porque integra modos de significação concebidos a partir de relações dinâmicas, ao permitir capturar a natureza multifacetada e holística da expressão humana, pois envolve todo o corpo num processo de aprendizagem e semiótico (FARIA, 2016).

Aprendizagem construtivista, colaborativa e investigativa alicerçada em comunidades virtuais

O modelo, como Garrison e Anderson (2005) também defendem, alicerça-se no conceito de comunidade de investigação. A aprendizagem baseada em comunidades estimula a reflexão e o discurso crítico, desenvolve a responsabilidade individual e social e fomenta o espírito crítico e criativo, desde que sejam criados nestas comunidades ambientes construtivistas e investigativos de aprendizagem. Para que tais ambientes sejam autossustentáveis, são necessários aquilo a que Garrison, Anderson e Archer (2000) chamam de presenças: Presença Cognitiva, Presença Social e Presença Docente ou de Ensino.

Na proposta de Garrison, Anderson e Archer (2010), a presença social ocorre nos AVA quando professores e tutores incentivam e estimulam a construção coletiva do conhecimento. Já a presença de ensino é percebida pelos estudantes nas orientações de leitura, explanações em videoaulas ou aulas interativas ao vivo, mediação nos chat e fóruns de discussões. Por fim, a presença cognitiva evidencia-se ao apoiar os estudantes na sua construção do conhecimento. Ao sobrepormos as presenças de ensino, social e cognitiva proporcionamos uma experiência educacional efetiva, como verificamos na Figura \ref{image2}.


Figura 2.1: Comunidade de Inquirição.



Fonte: Garrison, Anderson e Archer (2010).

Observamos que a sobreposição da presença de ensino e social, favorecem a criação de um clima de aprendizagem, enquanto que a presença social e cognitiva dá suporte ao estudante. A junção da presença de ensino e da cognitiva possibilitam a seleção de conteúdos apropriados para a aprendizagem. E no bojo destas três facetas da presença online, temos como resultado a expediência educacional efetiva.

Conforme detalhado no Quadro \ref{image5}, os autores Garrison, Anderson e Archer (2010) atribuem especial importância à presença de ensino, relacionando-a intrinsecamente com as outras presenças ao afirmarem que esta incide nas funções ou papeis dos professores e tutores, visando estabelecer um ambiente dinâmico propício para a aprendizagem.

Partindo-se de tais marcos teóricos, pressupõe-se que a aprendizagem pode ocorrer tanto de forma independente como de forma colaborativa, por meio do diálogo e interação entre os pares. A aprendizagem independente ocorre de forma autônoma, com base em atividades individuais, leituras do material didático e bibliografia disponibilizadas pelo docente. Já a atividade colaborativa pressupõe o trabalho desenvolvido em grupo, partilhando-se experiências com base em objetivos comuns e negociados.

Ressaltamos que a organização de grupos de estudantes fundamenta-se na visão de que a construção do conhecimento é socialmente construída e, por outro lado, contribui para que sejam minimizados os sentimentos de isolamento e desmotivação, comuns nos modelos tradicionais de EaD. Ademais, o trabalho em equipe é capaz de desenvolver competências nos estudantes para atuar no mundo do trabalho, em que as tarefas são cada vez mais interdependentes e exigem elevado nível de sinergia.


Quadro 2.1: Indicadores da presença de ensino.


Cabe ao estudante um papel ativo na administração do tempo das atividades, estabelecimento de metas de trabalho e formação de suas próprias comunidades de aprendizagem, resultando no desenvolvimento de sua autonomia no aprender a aprender e, consequentemente, preparando-o para a aprendizagem ao longo da vida.

Desta forma, este princípio implica no estabelecimento de uma pedagogia online que altera também o papel do professor. Ao invés de privilegiar a transmissão e avaliação de conteúdos, no estilo da educação bancária, denunciada por Paulo Freire, exige-se que o professor seja o facilitador ou o mediador do processo de ensino e aprendizagem, auxiliando os estudantes no desenvolvimento das capacidades metacognitivas, organizando a colaboração e estimulando a interação na comunidade de aprendizagem (FREIRE, 1996).

Espera-se, pois, que o professor seja criativo ao planejar as atividades de aprendizagem, mantendo uma postura de permanente reflexão e investigação sobre sua prática, sendo também rigoroso e solidário às dificuldades e necessidades dos estudantes, como nos lembra Freire (1996) ao descrever os saberes necessários à prática educativa.

Princípio da flexibilidade

A flexibilidade é um princípio nuclear que fundamenta as atividades de educação digital na UFRB. Compreendemos por flexibilidade a possibilidade do estudante aprender, onde e quando quiser, independente de distâncias e horários rígidos. Adicionalmente, o pesquisador espanhol García Aretio (2017) afirma a este respeito que a flexibilidade possibilita ao estudante permanecer no seu entorno familiar e profissional enquanto aprende, além de conciliar os estudos com outras formações.

As ferramentas síncronas e assíncronas utilizadas nos AVA possibilitam aos estudantes acesso às atividades de aprendizagem, independente do seu distanciamento geográfico. O design pedagógico do componente curricular deve apresentar um equilíbrio entre tais atividades, privilegiando-se ora a utilização de ferramentas assíncronas (tais como Fórum, Tarefas, wiki, glossário etc) e ora as síncronas (BigBlueButton, chat, etc).

Assim, considera-se que o processo pedagógico na educação digital é contínuo (no período em que ocorre o componente curricular), independente do tempo e localização geográfica dos estudantes e professores. Isso significa que, para as atividades assíncronas, os estudantes e professores podem desenvolver suas atividades em qualquer horário dentro do período estabelecido. Já as atividades síncronas, opcionais, requerem dia e horário previamente estabelecidos para os encontros online, considerando-se as especificidades locais dos estudantes e professores. Entretanto, o princípio da flexibilidade deve ser a tônica (tanto para estudantes, como professores e tutores), pois permite que os estudantes possam aprender a distância, conciliando a sua vida profissional e familiar com as atividades do curso.

A inserção das atividades síncronas e assíncronas nos componentes curriculares deve considerar as especificidades do Projeto Pedagógico de Curso (PPC). Por exemplo, alguns programas de educação formal preconizam encontros presenciais e outros definem avaliações presenciais regulares. Destaca-se que para garantir o princípio da flexibilidade, as atividades síncronas, devem ter datas e horários previamente estabelecidos, preferencialmente, em comum acordo com estudantes e professores.

Princípio da interação

A interação se constitui em um dos princípios balizadores no modelo pedagógico da educação digital na UFRB. A interação é compreendida nas suas perspectivas estudante-professor, estudante-conteúdo, estudante-AVA e estudante-estudante por meio das atividades propostas nos ambientes virtuais de aprendizagem.

Consoante com este princípio, Hirumi (2013) propõe 3 (três) possíveis níveis de interação que ocorrem nos ambientes virtuais de aprendizagem, conforme apresentados na Figura \ref{image3}.


Figura 2.2: Níveis de interação.



Fonte: Hirumi (2013, p. 10).

No nível I do modelo de interação do estudante preconizado por Hirumi (2013), observamos as interações internas do estudante que ocorrem quando trabalham sozinhos, assim como em pares ou pequenos grupos. Trata-se de seu processo de autorregulação e construído com base na sua interpretação e compreensão de uma dada realidade. Esse nível de interação individual pode ocorrer ao proporcionarmos que os estudantes postem suas reflexões num fórum de discussões, ou mesmo apresentem uma Tarefa com uma síntese comentada sobre determinado assunto em pauta.

No nível II, percebemos as interações humanas e não humanas, fundamentadas na sua interação com a interface ou AVA. Para que as interações ocorram satisfatoriamente, é preciso que o AVA tenha um design de interface que permita aos estudantes manipular as ferramentas das TDIC, visualizar facilmente os conteúdos e interagir uns com os outros.

Finalmente, temos o nível III no modelo de Hirumi que se relaciona com a interação aluno-instrução, ou seja, as estratégias educacionais utilizadas para projetar e sequenciar as interações no ambiente virtual, bem como selecionar as ferramentas e as mídias para facilitar cada interação associada com o objetivo de ensino, com base na filosofia educacional e crenças epistemológicas, sem considerar o disposto nos documentos norteadores do processo educativo, tais como o Projeto Pedagógico do Curso (PPC).

Destaca-se ainda que interação estudante-professor pressupõe elevado nível de visibilidade do docente no ambiente virtual de aprendizagem. Trata-se da necessária presença de ensino, preconizada por Garrison, Anderson e Archer (2010), sendo que sua visibilidade é percebida no AVA por meio das interações das mensagens, devolutivas, mediação nos fóruns, chat, videoaulas e aulas interativas online entre outras possibilidades.

Princípio da inclusão digital

O último princípio balizador da atuação pedagógica no modelo de educação aberta e digital da UFRB relaciona-se com a inclusão digital, compreendida como mecanismos para facilitar o acesso de estudantes adultos que não possuem a desenvoltura para a utilização das TDIC.

Na Figura \ref{image4}, observamos os fatores que contribuem para a exclusão digital. Como condições culturais, verificamos a necessidade de se garantir condições para o letramento digital, considerando-se a heterogeneidade que os estudantes apresentam no tocante à familiaridade com as TDIC. Também as condições econômicas se constituem em fatores de exclusão, especialmente em regiões com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que apresentam dificuldades financeiras para obter acesso a equipamentos e internet com banda larga. Decorrente disso, temos as carências nas infraestruturas tecnológicas, que dificultam a inserção nos ambientes virtuais de aprendizagem, seja por razões técnicas ou pela falta de recursos financeiros. Finalmente, a autora aponta as questões relacionadas com a acessibilidade digital, isto é, a ausência de elementos que possibilitem o acesso à pessoa com deficiência visual, auditiva etc (GOMES, 2008).

Assim, ao invés de exigir como requisito prévio para o acesso à universidade o domínio das TDIC, assume-se como objetivo educacional central da UFRB: a promoção de estratégias educacionais que contribuam para o desenvolvimento do letramento digital dos estudantes.


Figura 2.3: Fatores de exclusão digital.



Fonte: Gomes (2008, p. 7).

Tendo-se em conta que o ensino digital exige dos estudantes competências específicas, todos os programas de educação formal da UFRB deverão contemplar um curso prévio optativo, para que os estudantes possam adquirir tais competências antes de iniciar o curso em que se matricularam.

Este curso poderá ser ofertado como um curso de extensão aberto massivo online (MOOC), intitulado ``Orientação para EaD'', com carga horária mínima de um crédito (17h) e cuja ementa deverá contemplar conteúdos tais como os desafios, oportunidades e exigências para o estudante na EaD; o Ambiente Virtual de Aprendizagem da UFRB; as ferramentas de comunicação e interação, além dos processos avaliativos.

Ademais, os Polos de EaD credenciados para os programas formais da UFRB contemplam laboratórios de informática em que os estudantes poderão desenvolver ou melhorar seu letramento digital.

Em consonância com o princípio da inclusão digital, os AVA dos programas ofertados pela UFRB também deverão ser acessíveis às pessoas com deficiência, conforme as necessidades diagnosticadas para cada curso e pautando-se, sobretudo, pela ampla utilização dos Recursos Abertos de Aprendizagem (REA).