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CAUSAS DE EVASÃO DE UM CURSO PARA PROFISSIONAIS DE SAÚDE EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

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Miralva Ferraz Barreto1

Marizete Argolo Teixeira2

Resumo

O objetivo deste estudo foi analisar as possíveis causas da evasão de um curso de atualização para profissionais de saúde na modalidade a distância de uma escola de formaçãoem saúdeno município de Salvador, Bahia, Brasil. Pesquisaqualitativa e documental realizada a partir da análise do Projeto Pedagógico e do Ambiente Virtual de Aprendizagem de um curso de formação em saúde. Os resultados evidenciaramcomo causas de evasão a utilização de material denso e extenso, concepção instrucionista e avaliação pontual com teste ao final dos módulos. Sugerem-se algumas contribuições para os gestores da Educação a Distância que podem contribuir para redução deste evento, a saber:potencializar o papel pedagógico das tecnologias da informação e comunicação através da realização de atividades síncronas e assíncronas, o professor atuar como mediador do processo ensino-aprendizagem, utilizar material didático diversificado e elaborado por professores especialistas na área, realizar avaliação que possibilite acompanhar o desenvolvimento do discente de forma contínua contemplando todos os elementos envolvidos no processo ensino aprendizagem. Em uma perspectiva mais ampla, com estas contribuições, espera-se subsidiar os gestores para que trabalhem com uma equipe mínima de Educação a Distância na implantação de estratégias que fortaleça a gestão desta modalidade de educação.

Palavras-chave: Educação Permanente. Educação a Distância.Evasão.

1. Introdução

O Ministério da Saúde (MS) propôs em 2004 a Política Nacional de Educação Permanente da Saúde (PNEPS). Esta política preconiza a aprendizagem no trabalho, ação que visa qualificar os profissionais para melhoria do seu desempenho na prestação do cuidado e da gestão, culminando com a qualidade da atenção recebida pelo usuário(BRASIL, 2009).

Com o fortalecimento da Educação Permanente da Saúde(EPS) na área da saúde, os processos educativos vão sendo implementados, porém, ainda existe um quantitativo elevado de profissionais com necessidades reais de qualificação e uma das modalidades educativas eleitas é a Educação a Distância (EAD), a qual``surge como uma proposta que, quando utilizada corretamente pode constituir-se um instrumento facilitador aos processos de formação e capacitação de recursos humanos para o SUS'' (BRASIL, 2011, p.50).

Assim, foi no cotidiano de trabalho de uma instituição responsável pela formação de trabalhadores de saúde para o SUS que se percebeu a necessidade de qualificação por meio de um curso que disponibilizasse um quantitativo de vagas que permitisse a participação do maior número de profissionais. Entretanto, no curso de formação realizado foi evidenciado um índice significativo de evasão, motivo que levou as pesquisadoras a se debrusarem em uma análise minunciosa do Projeto Pedagógico de Curso (PPC) e do Ambiente de Aprendizagem Virtual (AVA) a fim de identificar as causas desta evasão.

Portanto, a relevância deste estudo se justifica pela possibilidade de apresentar conhecimentos que contribuam para a reflexão dos coordenadores e docentes de cursos de formação de profissionais de saúde na modalidade EAD acerca dos fatores que levam a evasão dos discentes, com vistas a proposição de estratégias que diminuam a taxa de evasão, pois existe uma real necessidade de qualificação destes trabalhadores, bem como servir de subsídios para o fortalecimento da gestão em EAD, haja vista ser uma modalidade importante para processos formativos.

Assim, este estudo teve como objetivo analisar as possíveis causas da evasão de um curso de atualização para profissionais de saúde, na modalidade a distância.

2. Métodos

Pesquisa qualitativa e documental realizada a partir da análise do PPC de Curso e do AVA de um curso de atualização para profissionais de saúde na modalidade EAD de uma Escola de formaçãoem saúde no município de Salvador, Bahia, Brasil.

Após leituras sucessivas dos documentos e organização dos principais pontos encontrados, decidiu-se apresentá-los de forma descritiva, discutindo-se com autores que abordam esta temática. Assim, será apresentadoo PPC, os sistemas de comunicação estabelecidos no processo ensino aprendizagem, os materiais disponibilizados no AVA e a modalidade de avaliação realizada.

  1. Resultados e discussão}

Nesta seção serão apresentados os resultados obtidos a partir da análise do Projeto PPC e do AVA, enfocando o sistema de comunicação estabelecido, os materiais disponibilizados no AVA e a modalidade de avaliação realizada.

Na análise do PPC foi possível identificar uma proposta pedagógica baseada na auto-instrução, ferramentas de interação por meio do "Fórum de Notícias" e do ``Fórum de Dúvidas e Comentários'', sendo este o local destinado para o contato dos discentes com a coordenadora do curso e os técnicos. A proposta de avaliação foi a realização de uma prova objetiva ao final do módulo, contendo 10 questõesde múltipla escolha aplicada no próprio ambiente virtual.

O curso disponibilizado na Plataforma Moodle está organizado em estrutura modular composta por quatro módulos com carga horária de 30 horas cada, totalizando 120 horas. O espaço destinado a comunicação é através do ``Fórum de Notícias'' e do'' Fórum de Dúvidas e Comentários'' no modelo e-Learning.

No AVA todos os módulos são abertos no início do curso, sendo que o Módulo I está dividido em dois momentos. Todos os módulos contam com aulas auto-explicativas em \emph{Power Point}, vídeo documentário, textos de apoio composto por manuais, leis, regulamentos, livros, fichas de informação, fichas de notificação, orientações técnicas, portarias e textos de apoio. Os materiais didáticos foram selecionados e/ou elaborados por técnicos do serviço e responsáveis pela gestão do curso sendo evidenciado material complementar com conteúdo muito denso e extenso conforme distribuição apresentada no Quadro 2.


Quadro 2: Recursos educacionais utilizados no curso de formação.


Fonte: Projeto Pedagógico do Curso de atualização para os profissionais da vigilância do trabalho e do Ambiente Virtual de Aprendizagem.

Evidenciou-se no AVA um potencial pouco explorado das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), haja vista que percebeu-se uma comunicação restrita a fórum de dúvidas e comentários, fórum de notícias com pouquíssima participação dos discentes, ausência de tutoria e do modelo \emph{e-learning}. Estes fatores corroboram com os dados da evasão evidenciados na literatura para os cursos ofertados na modalidade totalmente a distância (ALMEIDA, 2007; COELHO, 2001; COMARELLA, 2009; FAVERO, 2016; NEVES, 2006; PACHECO, 2010; RAMMINGER, 2006).

A elaboração de materiais digitais por técnicos do serviço e responsáveis pela gestão do curso é uma realidade nesta modalidade e um desafio para a gestão de EAD. Torrezzan e Behar (2009)destacam que a elaboração de material digital deveria ser composta por uma equipe interdisciplinar com envolvimento de um profissional das áreas de \emph{desing}, pedagogia e programação. Salientam ainda que, na prática, esta formação pode se reduzir a um professor conteúdista e um bolsista (normalmente programador) que podem não ter experiência necessária na elaboração destes materiais e na utilização de tecnologia digital.

Dessa maneira, a escolha dos materiais educativos também pode interferir possibilitando a interação e promovendo aprendizagem. Para que esta aprendizagem possa ser atingida, Averbug (2003, p.13) sugere:módulos independentes, permitindo estudo não sequencial; a linguagem, menos formal e mais comunicativa; o texto, mais flexível, tratado como hipertexto, permitindo idas e vindas, novas buscas, itinerários de leitura diferenciados [...]''. Para Passolli (2009, p. 3453):O material didático para EAD deve possuir algumas características: ser dialógico mantendo uma contextualização do conteúdo; [...] buscar a autonomia do sujeito; assegurar espaços de interação entre os participantes do curso por meio de ferramentas multimídia. Relativo ao material didático para o Mercado (2007, p.01):

[...] módulos semanais, os quais se dividem em capítulos coerentes, textos pequenos, mas que incentivem a reflexão, parágrafos curtos, letra clara, fundos de página simples, ícones significativos, navegação simples e fácil, ambiente amigável. Conteúdos básicos se ampliam com glossários, leituras complementares, bibliografia interessante e atualizada e conexões de interesse para aqueles que têm interesse em aprofundar o curso.

Ainda sobre os materiais disponibilizados merece destaque a hipertextualidade para Kensky (2012, p.95),``a hipertextualidade - funcionando como sequência de textos articulados e interligados, entre si e com outras mídias, sons, fotos, vídeos, etc - facilita a propagação de atitudes de cooperação entre os participantes, para fins de aprendizagem''. Portanto, a importância da utilização de diferentes materiais didáticos potencializando as interações entre os discentes favorecem o processo ensino aprendizagem.

Para que tais objetivos sejam alcançados, a gestão da EAD deve trabalhar integrada a diversos outros profissionais como web designers, designers gráficos, designers instrucionais, conteudistas, revisores, equipe de tecnologia. Esta integração possibilita uma construção coletiva e reflexiva do material, buscando a interação de diferentes mídias sendo atrativo e motivador ao proporcionar interação, interatividade e comunicação, garantindo a qualidade da aprendizagem dos alunos. Dentre as atividades propostas no processo ensino aprendizagem inclui-se a utilização de: portfólio, fóruns de discussão, estudos de casos, oficina wiki, seminários virtuais, sala de aula invertida etc. (SALES, 2005; PASSOLLI, 2009; BRASIL, 2007).

O processo de avaliação ao final de cada módulo foi realizado através de uma prova objetiva contendo 10 questões, seguida de um ``gabarito comentado'', cuja nota mínima é sete (7,0). O aluno teria três tentativas para realizar sua avaliação. Para Behar (2009), a avaliação realizada por meio de testes on-line apresenta limitação, as questões são pré-definidas, cabendo aos alunos responder e a correção é realizada pelo computador. Ao final, o professor recebe a nota, enfatizando o produto do conhecimento.

Para romper com esta concepção de avaliação pontual, a gestão da EAD precisa ver a avaliação como uma atividade natural e inerente ao processo de ensino sendo necessária a descrição clara das atividades propostas e dos mecanismos de avaliação ``[...] pode-se trabalhar com elementos complementares, como gerenciador de controle e aprendizagem, conciliando estes elementos com portfólio, fóruns, estudos de casos, seminários virtuais etc'' (POLAK, 2010, p. 155).

A gestão da EAD deve entender a avaliação em uma perspectiva mais ampla contemplando, assim, todos os elementos envolvidos no processo ensino aprendizagem. Para que esta perspectiva seja contemplada, faz-se necessário o acompanhamento do discente de forma contínua, processual e mediadora fugindo do processo tradicional com foco exclusivamente no produto.

Conclusão}

O estudo identificou a existência de fatores extrínsecos e intrínsecos como possíveis causas da evasão do curso de atualização para profissionais de saúde na modalidade EAD.Dentre os fatores intrínsecos destacam-sematerial denso e extenso, concepção pedagógica que não privilegia o nível de diálogo, redução dos espaços de interações, determinando isolamento e solidão ao discente e ênfase na avaliação pontual com teste ao final dos módulos.

Assim, faz-se necessário ao gestor ampliar seu conhecimento sobre legislação, importância d acompreensãodo potencial pedagógico com a utilização das TICs para aprendizagem e do trabalho integrado a uma equipe multidisciplinar. Este último é colocado como um desafio para a gestão, porque algumas instituições possuem equipe mínima de EAD na implementação dos cursos.

Diante disso, sugerem-se algumas recomendações para redução dos fatores intrínsecos à evasão, quais sejam: potencializar o papel das TICs realizando atividades síncronas e assíncronas; utilizar educação problematizadora, a partir dos problemas reais do mundo do trabalho, buscando autonomia e responsabilização das equipes;estímular a pesquisa, a leitura e a socialização, potencializando aprendizagens coletivas e colaborativas em rede; mudança da concepção instrucionista para construcionista; que o professor mediador atue com dinamismo, visão crítica e global e tenha justa remuneração; dispor de material didático diversificado e elaborado por professores especialistas, disponibilizado no ambiente de forma crítica, possibilitando maior interação e interatividade; atentar para módulos semanais, divididos em capítulos coerentes com textos pequenos e mais flexíveis tratado como hipertexto; propor avaliação que possibilite acompanhar o desenvolvimento do discente de forma contínua a contemplar todos os elementos envolvidos na aprendizagem.

Referências

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  1. Escola de Saúde Pública da Bahia -- miralva.barreto@saude.ba.gov.br 

  2. Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia -- marizeteargolo@uesb.edu.br