O USO DE ELEMENTOS DE GAMIFICAÇÃO COMO AUXÍLIO NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM DE ALUNOS COM TDAH: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA¶
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Nelian Leal Serafim1
Isa de Jesus Coutinho2
Resumo¶
O presente artigo tem o objetivo de analisar as produções científicas que correlatam o uso da gamificação como subsídio para a aprendizagem de alunos com TDAH e avaliar, por meio dos resultados dos estudos, a eficácia ou não do uso de elementos gamificados para a educação destes alunos. As investigações apontam que as atividades gamificadas apresentaram uma eficácia relevante quando analisadas em processos de aprendizagem de indivíduos com TDAH. Melhorias foram identificadas em diversas capacidades executivas e as mais citadas nos trabalhos foram atenção, memória de trabalho, engajamento, motivação e interação social. A análise destes trabalhos impulsiona o debate sobre a associação profícua e vantajosa entre a gamificação e o aprendizado de pessoas com necessidades educacionais especiais, evidenciando novas possibilidades para este instrumento, que assume um papel ímpar em cenários educacionais, no sentido de tornar, para este público, o processo de ensino e aprendizagem mais leve, prazeroso e, em consequência, muito mais efetivo.
Palavras-chave: Gamificação. TDAH. Aprendizagem.
1. Introdução¶
``O uso de mecânicas, estéticas e pensamentos dos jogos para engajar pessoas, motivar a ação, promover a aprendizagem e resolver problemas'' (KAPP, 2012, p. 10, tradução nossa), é o que conhecemos hoje como gamificação. A popularização da cultura digital também exerceu influência sobre o seu surgimento, entretanto, a gamificação não necessariamente precisa das tecnologias digitais para ser aplicada.
Segundo Kapp (2012), entretanto, para além da utilização de mecânicas de jogos às atividades, a gamificação pode ser vista como a captação da ideia de jogo e a posterior prática detalhada e cuidadosa dessa ideia objetivando resolver problemas e motivar a aprendizagem através dos elementos encontrados nos jogos que forem mais apropriados a cada situação.
Há uma série de elementos gamificados que podem ser utilizados em atividades com os mais diversos objetivos, mas é preciso muita cautela em seu uso, visto que a aplicação incorreta e desorientada pode acarretar um efeito inesperado, podendo causar desmotivação e, consequentemente, comprometer os resultados. Para propósitos educacionais alguns dos mais utilizados são: Desafios, que são tarefas que exigem esforço para alcançar recompensas; \emph{Feedback}, que fornece informações acerca da atuação do usuário e é essencial no processo de aprendizagem; e Recompensas, são benefícios adquiridos após uma conquista. (KLOCK et al., 2014).
O crescimento de pesquisas sobre gamificação em diversas áreas tem provocado curiosidade sobre a sua aplicação no meio educacional, visto que a utilização de elementos gamificados pode motivar, engajar e influenciar as pessoas (KAPP, 2012). Nesse contexto, a gamificação pode ser muito benéfica para indivíduos que tenham necessidades educacionais especiais, como é o caso do TDAH.
Caracterizado pelos principais sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade, o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), em conformidade com a Associação Brasileira do Déficit de Atenção, é um transtorno neurobiológico que ocorre devido a variações genéticas.
O diagnóstico do TDAH é clínico e se baseia em parâmetros objetivos e bem definidos. A Associação Psiquiátrica Americana e a Organização Mundial da Saúde possuem sistemas classificatórios com estes parâmetros que são o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V) e a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID-10), respectivamente.
Frequentemente o TDAH está associado ao baixo desempenho escolar, ao fracasso acadêmico e uma maior probabilidade de desemprego. A dificuldade apresentada em manter a determinação e concentração, com frequência é interpretada como preguiça e/ou irresponsabilidade. Ainda de acordo com o DSM-V, indivíduos com TDAH alcançam escolaridade menor e menos sucesso profissional e são acometidos por prejuízos à adaptação social, familiar e escolar/profissional (SERAFIM, 2018).
Independente da faixa etária, indivíduos com TDAH têm muita dificuldade na concentração, entretanto são capazes de se concentrar quando estão envolvidos em atividades que lhes são prazerosas. A dificuldade se acentua e acaba comprometendo o desempenho nas tarefas quando estão em situações desinteressantes, se entediam e se distraem facilmente. Em pessoas com TDAH as proporções desses problemas são substancialmente maiores que quando observados na população em geral (MATTOS, 2006).
Os estudantes com TDAH podem, frequentemente, manifestar problemas em selecionar informações relevantes e conservar a atenção numa mesma atividade. Além de ser essencial para a aprendizagem, a atenção serve para seletar, de forma voluntária ou involuntária, as informações às quais o cérebro deve se restringir e guardar (FARIA, 2013).
Nesse contexto este trabalho tem como objetivo revisar as produções científicas que correlatam o uso da gamificação como auxílio para alunos com TDAH e avaliar, por meio dos resultados dos estudos, a eficácia do uso de elementos gamificados para a educação destes alunos. Para isso, três perguntas norteadoras direcionaram a seleção das publicações para o estudo:
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Existem estudos que mostram a eficiência do uso de gamificação na aprendizagem de alunos com TDAH?
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Quais foram os resultados alcançados nessas pesquisas?
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Quais os métodos utilizados nessas pesquisas para a obtenção desses resultados?
2. Método¶
Este trabalho foi desenvolvido metodologicamente na disposição de uma revisão de literatura, a qual compreende pesquisar, relatar e elencar as ideias produzidas sobre certa questão no cenário atual.
Tendo definidas as questões norteadoras do estudo, as buscas se deram nas bases de dados Google Acadêmico, Scielo e PubMed no período de fevereiro a abril de 2019 através das seguintes palavras-chave: TDAH, Gamificação, Educação, Ensino e Aprendizagem, Funções Cognitivas. A pesquisa dos termos incluiu todos os campos do artigo e foram considerados artigos em Português, Inglês e Espanhol produzidos nos últimos 5 anos.
Para a seleção dos artigos foram definidas três etapas: 1) busca de estudos cruzando as palavras-chave definidas; 2) seleção de trabalhos após leitura dos títulos de acordo com os objetivos da pesquisa; 3) seleção de pesquisas após leitura completa dos trabalhos.
Foram selecionados 12 artigos que associavam gamificação, educação e TDAH, gamificação e pessoas com necessidades educacionais especiais ou atividades educacionais com elementos gamificados para indivíduos com TDAH, para a produção deste trabalho.
3. Resultados e Discussão¶
A utilização da gamificação para o melhoramento da aprendizagem e/ou o estímulo das funções cognitivas foram analisadas em diferentes óticas. Seis estudos lidaram com a aplicação de jogos e cursos através de Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA), 4 artigos desenvolveram protótipos gamificados e 1 artigo utilizou uma oficina que continha elementos gamificados.
3.1 Tratamento metodológico¶
No que se refere ao tratamento metodológico utilizado nos estudos selecionados tem-se 2 pesquisas quantitativas, 2 estudos de caso, 2 pesquisas experimentais, 1 revisão de literatura, 1 pesquisa descritiva, 1 pesquisa qualitativa, 1 pesquisa aplicada, 1 pesquisa exploratória e 1 pesquisa qualitativa e quantitativa.
\vspace{-0.7cm} \subsection*{3.2 População}
Dentre os estudos analisados o maior número constatado foi de 69 sujeitos e o menor foi de apenas 1. Com relação à faixa etária da população, 5 trabalhos foram produzidos com crianças e 1 com adolescentes.
\vspace{-0.7cm} \subsection*{3.3 Estratégias}
Como estratégias de investigação utilizadas 4 artigos fizeram a investigação através do uso de jogos e questionários ou entrevista após as atividades, 3 estudos utilizaram atividades gamificadas aplicadas a um ambiente virtual de aprendizagem e jogos, 1 estudo utilizou um aplicativo e 1 estudo utilizou uma oficina gamificada.
\vspace{-0.7cm} \subsection*{3.4 Principais resultados}
Os indivíduos com TDAH parecem se adequar a atividades que utilizam elementos gamificados em suas estruturas, uma vez que atendem muito bem suas necessidades pessoais e interesses. Isso torna a gamificação um mecanismo capaz de facilitar o processo de ensino e aprendizagem e a melhora de habilidades cognitivas de alunos que possuem necessidades educacionais especiais (CHANDRAN et al., 2018).
Na perspectiva de Sitra et al. (2016), basta apenas um elemento de jogo para transformar um curso numa atividade gamificada e tornar a sua execução mais agradável para os alunos, ocasionando uma consequente melhora na experiência de aprendizagem dos participantes. Rando e Sacchelli (2018) demonstram que, embora exista uma grande variedade de elementos de gamificação, há a necessidade de selecionar os conceitos que melhor se adequam aos sintomas apresentados por um indivíduo com TDAH.
A gamificação parece possibilitar o aprendizado do aluno enquanto ele se diverte, o que torna esse processo muito mais interessante e motivador (RANDO; SACCHELLI, 2018). Contudo, segundo Chandran et al. (2018), embora seja um método bastante eficaz e que gera um impacto positivo no desenvolvimento acadêmico dos estudantes, a gamificação não substitui os métodos tradicionais, mas podem ser combinados gerando um padrão eficiente de ensino.
Em um ambiente gamificado a interação pode estimular as funções executivas dos usuários. Todo jogo ou curso com elementos de jogos demandam recursos cognitivos que se enquadram nas funções executivas, como atenção seletiva, memória operacional, planejamento, estratégia e flexibilidade cognitiva.
Em todos os artigos estudados os autores constataram melhoria em diversas capacidades executivas.
\vspace{-0.7cm} \section*{4. Considerações Finais }
De acordo com alguns autores estudados, observa-se que os indivíduos com TDAH aparentam se adaptar muito bem a tarefas que utilizam elementos de gamificação em seus modelos pelo fato de se adequarem bem às necessidades dessas pessoas e atuarem de maneira eficaz na amenização de algumas disfunções características do transtorno. Todos os estudos destacam melhoria em diversas funções executivas, como motivação, memória de trabalho, atenção, engajamento, foco, entre outras. Tais investigações mostram que a gamificação é um método eficiente no sentido de contribuir para a construção de uma aprendizagem efetiva, funcional e prazerosa para as pessoas que possuem TDAH e outras necessidades educacionais especiais.
Dados os aspectos aqui destacados, avalia-se a possibilidade da produção de outros trabalhos nessa ótica. Diante da carência de estudos com sujeitos que tenham TDAH na fase adulta, podem ser conduzidas pesquisas com estudo de caso investigando os benefícios da utilização de atividades gamificadas para a aprendizagem de alunos do Ensino Superior ou um estudo de caso com alunos do Ensino Médio que tenham TDAH.
Dessarte, este artigo tem a expectativa de colaborar para o diálogo entre professores e pesquisadores que buscam inovação no processo de ensino e aprendizagem e maneiras mais efetivas de ensinar e contribuir para o aprendizado de indivíduos com necessidades educacionais especiais por meio da gamificação, objetivando a promoção de uma aprendizagem muito mais eficaz, divertida e prazerosa com um menor índice de frustração por parte dos indivíduos.
Referências¶
Associação Brasileira do Déficit de Atenção. O que é TDAH. Disponível em: https://bit.ly/2Pk01wo. Acesso em: 25 fev. 2019.
CHANDRAN, S. et al. Gamifying Education and Mental Health.Amhs Journal: Archives of Medicine and Health Sciences. Mangalore, Karnataka, p. 284-289, dez. 2018. Disponível em: https://bit.ly/2MdJkoj. Acesso em: 12 abr. 2019.
FARIA, F. C. de. O desenvolvimento do pensamento matemático em crianças com TDAH:Saber docente. 2013. 33 f. Monografia (Especialização) -- Curso de Matemática, Faculdade de Pará de Minas, Pará de Minas, 2013.
KAPP, K. M. The gamification of learning and instruction: game-based methods and strategies for training and education. San Francisco: Pfeiffer, 2012.
KLOCK, A. C. T. et al. Análise das técnicas de Gamificação em Ambientes Virtuais de Aprendizagem. Revista Novas Tecnologias na Educação, Joinvile, v. 12, n. 2, p.1-11, dez. 2014. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais [recurso eletrônico]: DSM-5 / [American Psychiatric Association; tradução: Maria Inês Corrêa Nascimento... et al.]; revisão técnica: Aristides Volpato Cordioli... [et al.]. -- 5. ed. -- Dados eletrônicos. -- Porto Alegre: Artmed, 2014.
MATTOS P. et al. Painel brasileiro de especialistas sobre diagnóstico do transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH) em adultos. Rev Psiquiatr RS, Porto Alegre, v. 22, n. 1, p. 50-60, 2006. Disponível em: https://bit.ly/2SC2pSw. Acesso em: 12 abr. 2019.
RANDO, D. R; SACCHELLI, G. S. Elementos da gamificação aplicados a objetos de aprendizagem para treinamento de crianças com TDAH. In: VI SINECT -- Seminário Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia, 2018, Ponta Grossa. Anais... Ponta Grossa: UTFPR, 2018.
SERAFIM, N. L. Estratégias pedagógicas para o estudo de matemática: um desafio particular dos alunos com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. Governador Mangabeira: IFBaiano, 2018.
SITRA, O. et al. The effect of badges on the engagement of students with special educational needs: A case study. Education And Information Technologies, [S.l.], v. 22, n. 6, p.3037-3046, 3 jan. 2017. Disponível em: https://bit.ly/2SCwAZV. Acesso em: 12 abr. 2019.
WILENS, T. E. et al. Attention-Deficit/Hyperactivity Disorder in Adults. JAMA. v. 292, n. 5, p. 619--623, 2004. Disponível em: https://bit.ly/2yblm5a. Acesso em: 11 abr. 2019.
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UFRB -- nelianserafim@gmail.com ↩
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UNEB -- isacoutinho13@hotmail.com ↩