GAME COMO FACILITADOR NO ESTUDO DA LINHA DO TEMPO HISTÓRICA¶
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Brigitte Bedin1
Marilúcia Campos dos Santos2
Resumo¶
O trabalho tem como objetivo apresentar a possibilidade de um game com propósito educativo. Partindo da premissa de que se pode aprender por meio desse tipo de objeto, o game entra em cena como facilitador no processo de aprendizagem, sem que se perca o foco educativo. Interação, prazer por meio do jogo, sendo a tecnologia e o espaço virtual responsáveis por essa possibilidade. Os serious games fazem parte do mundo corporativo e ganham espaço no contexto educativo. No Brasil essa realidade ainda não tomou corpo, pois existe ainda uma certa resistência por parte dos usuários que preferem games estrangeiros, no tocante aos serious games isso também se aplica, o que existe na verdade são encomendas pontuais para esse tipo de demanda. Na educação a utilização do jogo deve ser cautelosa, lembrando que não existe a possibilidade de transferir responsabilidades educacionais para o mesmo, mas sim, utilizá-lo com parcimônia e como facilitador nesse processo. O jogo proposto nesse artigo busca facilitar o aprendizado histórico da linha do tempo e suas divisões, uma vez que, existe dificuldade por parte dos alunos nesse tipo de estudo, assim sendo, o trabalho apresenta as fases e possibilidades do game em questão. Ressalta a ludicidade e o fluxo que envolve o jogador no universo histórico.
Palavras-chave: Game, facilitador, educação, lúdico, virtual.
1. Introdução¶
Aprender brincando é um sonho partilhado por muitos e os jogos digitais estão cada vez mais populares, envolvem e seduzem. A possibilidade de um recurso lúdico que facilite o aprendizado é instigante e desafiador.
Ao produzir um jogo digital didático, é essencial o foco educativo. A ludicidade é importante, mas o aprendizado é fundamental, por isso torna-se necessário unir esses dois elementos. Nesse contexto, essa ferramenta deve ser elaborada por especialistas em games sem esquecer do viés pedagógico.
De acordo com Oliveira (2013), o conceito de diversão está ''relacionado ao aprendizado do jogador durante a interação com o jogo''. Por isso, o jogador, por meio do jogo, consegue aprender pela experiência, prevê as possibilidades possíveis nas próximas jogadas, tudo isso tendo como pano de fundo o divertimento. Essa situação gera envolvimento e imersão. Para Csikszentmihalyi (2010), o jogo se traduz em diversão enquanto tarefas cotidianas são cansativas. A estrutura dos jogos propicia o prazer por causa de sua composição: regras, objetivos, pronta resposta e possibilidade de controle e concentração, tudo muito diferente do dia a dia.
Porém, esse contexto de jogo é enriquecido pelo uso das tecnologias e tudo que elas englobam. Barros (2009) aponta que as tecnologias visam ao atendimento da diversidade de informações disponíveis atualmente para o desenvolvimento dos conteúdos, ou seja, uma possibilidade a mais do ponto de vista didático-pedagógico. A autora destaca, citando Levy (1996) e Horrocks (2004), que o espaço virtual é caracterizado, entre outros elementos, pela informação e que ele é agente de mudanças globais, estimulador dos sentidos e responsável pelo montante de dados que chegam a nós. Barros (2009) discorre também sobre a transformação da percepção e da interatividade oferecida por este espaço, tornando a tecnologia um estímulo para o pensamento. Ainda sobre o espaço virtual, a autora destaca que a linguagem da web faz uma junção entre linguagens, línguas, símbolos e imagens, os quais converteram-se em elementos de aprendizagem indutiva pela lógica e pela experiência do dia a dia.
Barros (2009) conclui, portanto, que há grande possibilidade de aprender no ambiente virtual, espaço no qual isso ocorre amplamente, de forma detalhista e com múltiplas percepções. No ambiente virtual a motivação e os interesses do indivíduo são o ponto principal a ser considerado e não a lógica de facilidades ou dificuldades com esse ambiente. Além disso, idade, linguagem, formação e diferenças institucionais não impossibilitam o desenvolvimento neste espaço, pois ele é aberto e acessível.
No tocante ao Brasil, Alves e Hetkowski (2007) traçaram o perfil do gamer brasileiro, por meio de entrevistas realizadas com 220 indivíduos de todo o país, entre 9 e 59 anos. Na pesquisa constatou-se que, mesmo sem acesso a algum tipo de jogo, no geral os entrevistados desvendaram os símbolos envolvendo os games. A educação no século XXI conta com avanços digitais estruturados na aprendizagem informal, educação a distância, aprendizagem colaborativa, e o game faz parte deste universo, portanto será o objeto por nós analisado.
Fagundes e Garcia (2014), em pesquisa, observaram que alunos de séries iniciais têm pouco ou nenhum conhecimento prévio de História e quando chegam ao 6º ano, essa ausência fica evidente. Os autores argumentam que isso ocorre em função dos professores dessas séries abordarem os mais diversos temas, mas, por falta de formação específica, não abordar os conteúdos históricos. Esse ensino fica limitado aos livros didáticos e memorização de fatos e datas, tendo como objetivo apenas a aprovação na disciplina. Não existe uma preocupação com o tempo e o espaço, a importância da História na formação do indivíduo fica aquém e, para o aluno, o entendimento aprofundado e o significado histórico se tornam difíceis de entender, pois não exercitam o pensamento nessa direção.
Portanto, os professores Fagundes e Garcia (2014), diante do quadro apresentado, propuseram um estudo com o intuito de facilitar o entendimento de História, sob a perspectiva glocal -- global e local -- que envolve: Antropologia, História, Sociologia e práticas culturais (RODRIGUES, 2017) -- a qual foi aplicada em alunos do 6º ano, cujo viés envolvia a realidade deles. Nesse contexto, buscaram relacionar o que acontecia no local com acontecimentos do mundo, envolvendo educação, economia e ambiente. Essa foi uma forma de mostrar que tudo está interligado, que existe um entrelaçamento entre o local e o global. Para isso, se reportaram às memórias envolvendo a sala de aula, tendo como objetivo criar a identidade do aluno, uma construção com cunho social.
Assim sendo, inspirada na pesquisa de Fagundes e Garcia (2014), no presente trabalho, a linha do tempo histórica foi escolhida para a elaboração de um game. A escolha justifica-se por ser um assunto que embora possa parecer simples e de fácil aprendizagem, representa dificuldade para alunos de diversas idades, pois eles não conseguem estabelecer a linha do tempo e seus respectivos períodos.
O game proposto será dividido em: Pré-história; História Antiga; História Medieval; História Moderna; História Contemporânea; e Pós-modernidade. No total serão sete (7) fases, sendo a primeira uma sala de aula e as demais os níveis, cada qual representado por um período histórico.
A dinâmica do jogo consistirá em apresentar desafios para que o aluno passe para a fase seguinte, ou seja, num primeiro momento, ele se encontra na sala de aula e, para dar início à aventura, terá que passar por um portal do tempo localizado na lousa. Para tanto, deverá resolver alguns enigmas e obstáculos até que chegue no portal. Fase por fase, deverá transpor os obstáculos e conquistar o ''passe'' para a próxima etapa.
Diante do exposto, o presente trabalho pretende demonstrar que é possível ensinar por meio do jogo, sendo este um facilitador do aprendizado.
2. Serious games: mercado e responsabilidades¶
Silva (2014) aponta que embora existam diversas denominações para jogos voltados para outros fins que não a educação, o termo mais usual é serious games. Esses jogos foram usados em diversas áreas: militar, governamental, na área da saúde, em marketing, empresas e na educação. Destaca que entre os benefícios dos serious games na educação estão a ludicidade, a competição e o ato de compartilhar, além da possibilidade de aprimorar competências e habilidades. O jogo vem como um elemento a mais e uma forma de atrair e motivar.
A produção de um game envolve diversos profissionais, como o designer de games, músicos, artistas visuais, modelador, entre outros. Todos devem entender com clareza a dinâmica e preceitos do game que será desenvolvido, no entanto, o game designer responsável fará o arremate de todas as áreas envolvidas. Além disso, o game nos remete ao entretenimento, não existe um mercado forte de serious games, jogos voltados para treinamentos e educação (SANTAELA; FEITOZA, 2009).
Os serious games servem de apoio na aprendizagem quando atrelados às teorias da ciência cognitiva. Entre as diversas teorias, destacamos:
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Teoria cognitivista, na qual, segundo Bruner, o aluno é ativo e responsável pelo seu aprendizado, levando-se em conta suas experiências enquanto indivíduo;
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Teoria sociocultural de Vygotsky, em que o meio social no qual estamos inseridos é responsável pelo conhecimento adquirido inicialmente, sendo interiorizado a partir do desenvolvimento de habilidades específicas;
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Teoria da inclusão produzida por David Paul Ausubel, que não descarta a importância do meio social, mas dá crédito maior ao que se desenvolve em sala de aula, levando em conta os conhecimentos prévios do aluno com o intuito de adequar os materiais didáticos;
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Aprendizagem baseada em problemas de Bransford, que propicia situações de análise e resolução de problemas, residindo aí uma forma de aprender.
A aplicação destas teorias nos serious games possibilita um ganho maior, pois entram em cena aspectos fundamentais no ensino-aprendizagem, são eles: a motivação por promover a descoberta do que é proposto no jogo; reflexão; planejamento e busca por estratégias que levem ao sucesso no jogo; escolhas que irão impactar no resultado final; entendimento dos processos concorrentes e de avaliação (DANTAS; BUBLITZ; QUEIROZ, 2011).
O Relatório do Mapeamento da Indústria Brasileira e Global de Jogos Digitais, desenvolvido pelo Núcleo de Política e Gestão Tecnológica -- PGT, aponta que no Brasil o mercado consumidor prefere os jogos importados, cujo investimento é altíssimo e consideram sua qualidade superior. Se já não é fácil para os games populares, no que se refere aos jogos educativos, então, essa realidade é mais custosa e depende de encomendas feitas por empresas ou escolas.
Vamos tentar justificar isso de forma mais consistente? Por que não é sensato? A proposta consiste em ter um jogo digital com boas possibilidades, para então o profissional do ensino elencar os conteúdos e as respectivas competências que podem ser desenvolvidas, tendo como suporte o jogo digital. Um bom exemplo é o War®. Embora não pretenda ensinar geografia, o faz com sucesso (SANTAELA; FEITOZA, 2009).
3. Os jogos digitais na educação¶
Ao pensar no jogo como possibilidade educativa, precisamos tomar alguns cuidados, pois essa proposta não pode representar uma solução para os problemas enfrentados na educação, o jogo é mais um objeto de aprendizagem que pode ser explorado se usado com parcimônia. Alves (2008) discute essa questão quando reitera que não podemos pensar no jogo digital enquanto desenvolvedor de conceitos, cognição e por último diversão. Lembrando que esta ferramenta é simplista, contrapondo as teorias clássicas da educação.
A visão conteudista em jogos deve ser descartada. Deve-se sim buscar um jogo que seja envolvente e que possibilite desenvolver os conteúdos e competências necessárias sob responsabilidade do docente, sendo o jogo um suporte (SANTAELA; FEITOZA, 2009).
Outra questão interessante é a narrativa propiciada pelos games com interação lúdica narrativa. São inúmeros os exemplos que indicam esta possibilidade: o jogo War com suas batalhas épicas; ou o Super Breakout que narra uma história fantástica; no Monopoly com a disputa entre barões. São infinitas possibilidades e experiências que envolvem narrativas. O desafio consiste em usar essa possibilidade de diversas formas. Um único jogo pode ter inúmeras perspectivas. Dessa narrativa fazem parte: personagens, cenários e o próprio enredo (SALEN; ZIMMERMAN, 2012).
Pensando nos jogos para a educação, um jogo voltado para a História, além de viável, é também fascinante. Podemos jogar tendo como enredo a própria História, o mundo não ficcional, tornando esse tema interessante e sedutor.
4. Pensando um jogo¶
O jogo proposto possui sete fases. A primeira fase tem como cenário uma sala de aula. O desafio consiste em chegar até a lousa, a qual é um portal que leva à próxima fase. A Figura 1, sala de aula, apresenta uma sala comum em perspectiva:
Figura 1: Sala de aula.
Fonte: A autora.
Ao dar início ao jogo, o jogador vê a planta baixa da sala (Figura 2), a qual apresenta desafios/obstáculos e prêmios, levando-o a se aproximar do portal.
Figura 2: Planta baixa da primeira fase.
Fonte: A autora.
O jogo deve ser intuitivo, as setas vão piscar conforme o jogador for avançando. Os obstáculos surgem e a cada etapa vencida abra-se a passagem para a próxima etapa na fase correspondente. No final da primeira fase o jogador deverá responder as seguintes perguntas:
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Seu nome;
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Sua idade;
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E a última pergunta instigando o jogador: Quer viajar no tempo?
As próximas fases seguem a mesma abordagem, passo a passo o jogador vai seguindo no tempo, vencendo os desafios e obstáculos.
Figura 3: As fases seguintes.
Fonte: A autora.
As fases obedecem a sequência lógica e progressão do mais antigo para o mais novo. Ao final de cada fase o jogador deve atingir o prêmio máximo, só assim terá condições de avançar. Os prêmios estão atrelados a um fato histórico relevante da época. Exemplo: Na História Antiga o desafio consiste em tirar a Espada de Lancelot da pedra fundamental.
Figura 4: Espada de Lancelot.
Fonte: A autora.
O jogo é finalizado quando o jogador chega à Pós-modernidade. Nessa fase são abarcados assuntos e imagens da atualidade e o prêmio final é o Troféu Master. No seu desenrolar fatos e imagens vão surgindo, dessa forma o jogador vai relacionando e associando tais informações. A narrativa é importante e pequenas histórias vão sendo contadas no decorrer da empreitada, além de motivar e envolver, a história contada dá sentido à brincadeira.
O personagem deve ter relação com o jogador -- segundo Almeida (2019) Professor da SAGA: School of Arts, Games -- o flow ocorre conforme propiciamos um reporte ao dia-a-dia do aluno, isso envolve cores, lugares, particularidades do quotidiano e pessoas próximas às imagens conhecidas pelo jogador. O personagem escolhido é um adolescente com características do \emph{cartoon}.
Figura 5: Personagem.
Fonte: A autora.
Todo o ambiente é cuidadosamente planejado, tendo como premissa envolver o jogador, ou seja, ao elaborar um jogo a multidisciplinaridade está presente em todos os momentos da execução, temos a arte, a modelagem das imagens, o trabalho de programação em 3D e acima de tudo, se falamos em jogo educativo não podemos deixar de lado a construção pedagógica.
Espera-se que ao final do jogo, as divisões básicas das fases históricas, tenham sido assimiladas e interiorizadas pelo jogador. Que essas informações passem a fazer parte dos conhecimentos do jogador e que seja simples e clara essa interpretação.
5. Considerações finais¶
Com a tecnologia avançando cada vez mais, torna-se primaz que a educação também acompanhe esses avanços. Os alunos mudaram e os educadores também precisam acompanhar essas mudanças. Nesse contexto hoje temos inúmeras possibilidades, entre elas os games. Os alunos não mais se enquadram nas metodologias antigas e ultrapassadas, a linguagem mudou e o ensino tradicional perdeu seu lugar para um ensino envolvente e interativo.
Jogos estruturados e direcionados ao aprendizado tendem a se tornar algo comum com o tempo, cabe aos educadores buscar soluções viáveis e envolventes, que possibilitem ensinar de forma prazerosa e eficaz.
Referências¶
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SILVA, Giancarlo Lima da .EduQuest: uma proposta para o uso de serious games na educação e na capacitação profissional. Rio Grande do Norte: Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, 2014. Disponível em: https://www.academia.edu/11690740/EduQuest_Uma_proposta_para_o_uso_de_Serious_Games_na_educa\%C3\%A7\%C3\%A3o_e_na_capacita\%C3\%A7\%C3\%A3o_profissional. Acesso em: 13 maio 2019.
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UFRB -- bbedin@gmail.com ↩
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UFRB -- marilucampos@gmail.com ↩