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CARACTERIZAÇÃO SOCIOAMBIENTAL E METAIS-TRAÇO EM FOLHAS DA Rhizophora mangle L. (Rhizophoraceae) NA APA TINHARÉ-BOIPEBA, BAHIA (BR)

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Manuel Vitor Portugal Gonçalves1

Antônio Bomfim da Silva Ramos Junior1

Rodrigo Alves Santos1

Flavio Souza Batista1

Manoel Jerônimo Moreira Cruz2

Iracema Reimão Silva2

Cristina Maria Macêdo de Alencar3

Juan Carlos Alva Rossi3

Resumo

Esta pesquisa pretendeu investigar a qualidade das águas superficiais e os teores de metais (Cu, Zn, Cd e Pb) em folhas de Rhizophora mangle na APA Tinharé-Boipeba, Litoral Sul da Bahia, Brasil. Foram tomadas medidas _in situ} de variáveis físico-químicas de águas superficiais (temperatura, pH, OD, salinidade), com auxílio de sonda multiparâmetros, e coletadas folhas em 10 pontos amostrais, para as análises biométrica, integridade foliar e leitura dos teores dos metais (F-AAS). Os resultados das análises do OD revelaram haver alteração da qualidade das águas costeiras na ilha de Tinharé, decorrente de deficiências no saneamento ambiental. Os níveis foliares dos metais foram considerados normais e não tóxicos (Zn > Cu > Pb > Cd), sendo inferiores as áreas costeiras impactadas, cabendo o monitoramento dos elementos-traço nas folhas de mangue, fauna, água e nos sedimentos.

Palavras-chave: Manguezais, Qualidade Ambiental, Metais Pesados.

1. Introdução

Os ecossistemas costeiros e marinhos encontram-se sob pressão da poluição e rápida urbanização (ZHANG et al., 2014). A poluição por metais representa risco à saúde e ao ambiente, porque são reativos e persistentes nos ecossistemas (ABOU SEEDO et al., 2017).

A degradação dos ecossistemas marinhos, costeiros e terrestres acompanham a produção de injustiças sociais, uso do solo e o modelo de desenvolvimento atuantes na APA Tinharé-Boipeba, Litoral Sul Bahia (Figura 1), impulsionado pelo turismo, pesca predatória e atividade petrolífera (SILVA et al., 2007; PELEGRINI, 2011; ALENCAR, 2011; ELLIFF; KIKUCHI, 2017). Esta pesquisa pretendeu investigar a qualidade das águas e os teores de metais-traço nas folhas da Rhizophora mangle L. (Rhizophoraceae) na APA Tinharé-Boipepa.

2. Área de Estudo

Esta pesquisa foi realizada na Área de Proteção Ambiental (APA) Tinharé-Boipeba, no Litoral Sul da Bahia, Brasil (Figura 1), com população de 15.374 habitantes (IBGE, 2010), 43.000 hectares e clima quente e úmido e pluviometria de 2.117,7 mm/ano.

Na geologia local, afloram arenitos, carbonatos e folhelhos cenozoicos ou mesozoicos da Bacia de Camamu, depositados sobre o embasamento cristalino gnáissico (BARBOSA; DOMINGUEZ, 1996). Esta Bacia tem relevância hidrogeológica e hospeda minérios não-energéticos (barita), óleo e gás nos folhelhos da Fm. Sergi. Destacam-se, entre as referências paisagísticas e patrimônio natural que constituem ao turismo na APA, os terraços arenosos marinhos holocênicos e pleistocênicos, os recifes de corais e algas coralinas, os manguezais, as áreas úmidas, falésias areníticas ou carbonáticas, as enseadas e os promontórios rochosos.

Figura 1: Mapa de localização, e espacialização dos pontos amostrais (E1-E10) na APA Tinharé-Boipeba, Bahia (recifes pétreos em cinza).



2. Materiais e Métodos

Foram mensuradas _in situ} as variáveis físico-químicas em dez pontos de coletas de águas superficiais, com auxílio de sonda multiparâmetros, sendo também coletadas folhas da _Rhizophora mangle} para análises biométrica, integridade foliar e metais (Cu, Zn, Cd, Pb) (F-AAS), nos laboratórios LEMA (UCSAL) e Núcleo de Estudos Ambientais -- NEA (UFBA).

A análise estatística contemplou uma abordagem descritiva e inferencial com auxílio de testes diversos, como os testes de normalidade (Shapiro-Wilk), o teste de comparações múltiplas paramétrica (_ANOVA}) ou não-paramétrica (_Kruskal-Wallis, Mann-Whitney}), com nível de significância de 0,05%, e a aplicação da análise de agrupamentos (_cluster analysis}). %

3. Resultados e Discussão

3.1. Classificação e Qualidade da Água

A Tabela \eqref{tabelad} permite uma análise da qualidade das amostras de águas superficiais, classificadas na Classe 1 das águas salobras, de acordo com a Resolução 357/05 do CONAMA (BRASIL, 2005). Estas águas têm salinidade de 0,5 a 30 PSU e destinam-se à recreação de contato primário, irrigação, à proteção da biota aquáticas, aquicultura e a pesca.

As condições alcalinas das amostras foram atribuídas à influência das águas marinhas, de modo que os maiores valores do pH ocorreram na foz do rio Catu (E7-E8) e rio Bainema (E9). Os valores do pH das amostras do presente estudo foram similares aos resultados obtidos para águas costeiras de Garapuá e Barra dos Carvalhos, exceto estuários (Tabela 1). Os estuários são ecossistemas sensíveis às interações entre a água doce, a água salina, sedimentos e às oscilações diárias da maré (CHE, HE e LIN, 2003). Nas condições de pH das amostras da APA, os íons metálicos tendem a ser precipitados como hidróxidos e adsorvidos aos argilominerais no material particulado em suspensão (NURCHI; VILLAESCUSA, 2008).

Tabela 1: Variáveis físico-químicas de água superficial de estuários e áreas costeiras da Bahia.



Os níveis do oxigênio dissolvido (OD) mais baixos foram relacionados ao despejo _in natura} de ``esgotos'', como observado no ponto E3, na 4º Praia, em Morro de São Paulo, cujas praias são importantes atrativos ao turismo, e sugeriram possíveis problemas higiênico-sanitário e da balneabilidade nas 3ª e 4ª Praias de São Paulo Morro (E3 e E4), norte da APA. A qualidade das águas costeiras é apontada em pesquisas como o atributo mais relevante para a satisfação de pessoas e ao uso da praia (WILLIAMS; NELSON, 1997; MORGAN, 1999).

3.2. Biometria e Teores de Metais nas Folhas de Mangue

O comprometimento da integridade foliar decorreu na seguinte ordem: clorose e limbo revoluto (61-62%) > manchas escuras, herbivoria, perfurações e necrose (50%) > galhas. A Figura 2 compara a área foliar (cm\textsuperscript{2}), cujas medianas diferiram nas ilhas de Tinharé (44,1 cm^{2}) e Boipeba (47,84 cm^{2}), segundo o teste de _Kruskal-Wallis} (_p=0,007}). A redução da área foliar pode decorrer de estressores crônicos, como a salinidade, aporte de matéria orgânica, herbivoria, parasitismo e toxidade de metais-traço (SCHAEFFER-NOVELLI, 1995).

Tabela 2: Distribuição dos valores da área foliar % (cm²) da _R. mangle_ nas estações amostrais.



A Tabela 2 mostra os níveis de metais-traço das folhas da R. mangle da APA Tinharé-Boipeba (Zn > Cu > Cd > Pb). Houveram teores abaixo do limite de detecção do método do Cu (E1, E5, E6, E9). O teste de Mann-Whitney indicou não haver diferença significativa entre as medianas do Zn (p=0,95), Cd (p=0,98) e Pb (p=0,6) de Tinharé e Boipeba. Os teores do Cu foram faixa de normalidade de Ross (2004), e no ponto E10 atingiu o ótimo apontado por Hopkins (2000) e Epstein e Bloom (2006). A análise de agrupamento revelou que as alterações na biometria não decorreriam de teores de metais, mas de estressor não investigado.

Tabela 3: Sumário estatístico dos valores da altura, área foliar e metais nas folhas da _R. mangle}.



4. Conclusões

Os aspectos da qualidade da água exigem melhora no saneamento ambiental e consulta à comunidade para a elaboração de soluções técnicas compatíveis com os usos da natureza na APA Tinharé-Boipeba. Os bosques de mangue encontram-se em bom estado de conservação, cabendo o monitoramento de metais-traço nas folhas de mangue, fauna, água e sedimentos.

5. Referências Bibliográficas

ABOU SEEDO, K.; ABIDO, M. S.; SALIH, A.A.; ABAHUSSAIN, A. Assessing heavy metals accumulation in the leaves and sediments of urban mangroves (Avicennia marina (Forsk.) Vierh.) in Bahrain. International Journal of Ecology, v. 24, p. 35-52, 2017.

ALENCAR, C. M. M. Tensões entre pesca, turismo e exploração de gás reconfigurando ruralidade na ilha de Boipeba--BA. Desenvolvimento e Meio Ambiente, v. 23, p. 149-166, 2011.

BARBOSA, J.S.F.; DOMINGUEZ, J. M. L. (Coords.). Texto Explicativo para o Mapa Geológico do Estado da Bahia. Escala 1: 1.000.000 - SGM/PPPG/FAPEX: Salvador, 1996.

BRASIL. (2005). Ministério do Meio Ambiente. Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). Resolução no 357 de 17 de março de 2005. Diário Oficial da União, Brasília.

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ELLIFF, Carla I.; KIKUCHI, R. K.P. Ecosystem services provided by coral reefs in a Southwestern Atlantic Archipelago. Ocean & coastal management, v. 136, p. 49-55, 2017.

EPSTEIN, E.; BLOOM, A. J. Nutrição mineral de plantas: princípios e perspectivas. Princípios e perspectivas. Londrina: Editora Planta, 2006, 403p.

ERNST, W. H. O.; VERKLEIJ, J. A. C.; SCHAT, H. Metal tolerance in plants. Acta botanica neerlandica, v. 41, n. 3, p. 229-248, 1992.

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IBGE (2010). Dados do Censo demográfico 2010 publicados no Diário Oficial da União. 24/11/2010.

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PELLEGRINI, J.A.C. Vulnerabilidade socioambiental dos manguezais de Guarapuá, Cairu/BA frente à inserção da indústria petroleira. Tese de doutorado, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, 2011.

SCHAEFFER-NOVELLI, Y. (1995). Manguezal: ecossistema entre a terra e o mar. São Paulo: Caribbean Ecological Research, 64p.

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ZHANG, Z. W.; XU, X. R.; SUN, Y. X.; YU, S.; CHEN, Y. S.; PENG, J. X. Heavy metal and organic contaminants in mangrove ecosystems of China: a review. Environmental science and pollution research, v. 21, n. 20, p. 11938-11950, 2014.


  1. Grupo Geoquímica das Interfaces, Universidade Federal da Bahia. hidrovitor81@gmail.com

  2. Pós-Graduação em Geologia, Universidade Federal da Bahia. E-mail: jc9508@gmail.com

  3. Pós-Graduação em Planejamento Ambiental, Universidade Católica do Salvador. E-mail: cristina.alencar@ucsal.br