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UCIDES CORDATUS (CARANGUEJO-UÇÁ) ENQUANTO BIOINDICADOR DE IMPACTOS AMBIENTAIS NOS MANGUEZAIS DA BAÍA DE TODOS OS SANTOS

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Daniele de Andrade Santos1

Fábio Santos de Oliveira2

Luana Oliveira Soares3

Marcelo Biondaro Gois4

Sibele de Oliveira Tozetto Klein5

Tainá de Andrade Lima6

Resumo

A Baía de Todos os Santos (BTS) é uma das maiores Baías do mundo e sofre cada vez mais impactos antropogênicos. O Caranguejo-Uçá, espécie de crustáceo encontrado nessa região pode ser utilizado como bioindicador desses impactos. Assim, esse estudo teve como objetivos dosar a concentração de glicose e de proteína na hemolinfa dos espécimes e observar possíveis modulações desses parâmetros. Foram coletados 80 animais em 10 pontos. Para dosagem de glicose foi utilizado kit comercial para plasma sanguíneo com adequações; de proteínas foi usado reagente Comassie Brilliant Blue G 250. Em São Roque, Ponta Grossa e Jaguaripe, houve concentrações de glicose mais elevadas apresentando média de 117; 56,9; 66,7 mg/dl, respectivamente, que pode ser indicativo de contaminação ambiental visto que o valor aceitável é 0,54 a 25,2 mg/dl. Os níveis de proteínas apresentaram variação, que pode ser devido mudança de fase de desenvolvimento dos animais, sendo aceitável a variação encontrada.

Palavras chave: caranguejo; glicose; hemolinfa.

1. Introdução

A Baía de Todos os Santos (BTS) é uma das maiores Baías do mundo e vem sofrendo cada vez mais impactos antropogênicos decorrentes de atividades industriais, saneamento básico insuficiente, atividades de pesca indevida, entre outras. (RIOS et al, 2017). Os manguezais funcionam como berçário para diversas espécies de animais e várias delas são fontes de proteínas consumidas ou comercializadas pelas comunidades ribeirinhas.

Para quantificar a qualidade desses ecossistemas é necessário avaliar os efeitos das alterações nos componentes químicos, físicos e biológicos decorrentes de impactos antropogênicos. Alguns crustáceos decápodas são utilizados como bioindicadores devido as alterações fisiológicas, mortalidade ou desaparecimento decorrente de ambientes contaminados (PINHEIRO et al, 2012).

A espécie de caranguejo Ucides cordatus, conhecida popularmente como caranguejo-uçá é encontrada comumente nessa região, e pode ser um dos representantes de um ecossistema de transição terrestre-aquático, além de ser uma espécie de fácil captura e conservação. Ucides cordatus pode sofrer mudanças no seu metabolismo de acordo com as suas fases de crescimento, todavia, tais mudanças podem se apresentar induzidas pelos impactos antropogênicos citados. Dessa forma, essa espécie pode ser utilizada como bioindicador, que pode mostrar alterações em seu metabolismo, decorrentes ou não de contaminantes no ambiente. Por isso, o objetivo desse estudo foi determinar os níveis de glicose e de proteína na hemolinfa de espécimes coletados na BTS, com o intuito de observar possíveis correlações entre os níveis de glicose e de proteína no caranguejo com os impactos antropogênicos na região.

2. Materiais e métodos

Foram coletados ao todo 80 espécimes, as coletas dos animais foram feitas em pontos pré-definidos da BTS, sendo eles: Maragogipe (5), São Roque (16), Saubara (7), Ponta Grossa (8), Caixa Prego (8), Pitinga (8), Jaguaripe (6), Aratuípe (7), Acupe (8) e Candeias (Rio São Paulo) (7). Empregou-se a técnica de braceado e os animais foram acondicionados em recipientes adequados e identificados por ponto e data de coleta, sendo transportados vivos e íntegros, para extração da hemolinfa.

A hemolinfa foi extraída da membrana artrodial dos espécimes vivos, através de seringa tipo insulina que possuíam filme anticoagulante de citrato de sódio a 10%. Posteriormente foi conservada em microtubos do tipo eppendorf, previamente identificados, mantidos à --30°C para posteriores análises bioquímicas.

A glicose foi quantificada por meio de kit comercial para análise em plasma sanguíneo humano, com adequações para o uso na hemolinfa, sendo as leituras espectrofotométricas realizadas a 510 nm.

O total de proteínas na hemolinfa dos crustáceos foi determinado espectofotometricamente à 595 nm empregando como reagente o Comassie Brilliant Blue G 250. A curva padrão foi preparada utilizando-se soluções de albumina sérica bovina (BSA) a 1 μg/μL em escala de 0,1 a 1 μg/μL. Os valores de absorbância obtidos para as amostras foram comparados com a curva padrão para a determinação da concentração de proteínas, em μg/μL de hemolinfa.

3. Resultados e Discussões

Conforme apresentado na Tabela I, São Roque foi o ponto em que foi observada a maior concentração de glicose na hemolinfa dos animais, revelando uma média de 117.9 mg/dl. Seguido por Ponta Grossa e Jaguaripe, que apresentaram concentrações próximas, apresentando uma média de 61.8 mg/dl. Em Maragogipe, Saubara, Caixa Prego, Acupe e Candeias, o valor médio de glicose na hemolinfa foi de 19.2 mg/dl. Por fim Pitinga e Aratuípe apresentaram as menores concentrações, com uma média de 7.1 mg/dl.

Nos crustáceos as concentrações de glicose normalmente são mais baixas que nos mamíferos, variando entre 0,54-25,2 mg/dl (Verri et al, 2001). A maioria dos resultados desse estudo é compatível com tais valores, com exceção das amostras de São Roque, Ponta Grossa e Jaguaripe, as quais podem indicar consequências de ações antropogênicas na região.

Quadro 1: Parâmetros Bioquímicos em hemolinfa por ponto de coleta (média, desvio padrão e faixa de valores).



Considerando a zona de uma mesma bacia hidrográfica, ao comparar os níveis médios de glicose de pontos potencialmente impactados por contaminantes com aqueles obtidos em pontos com menores riscos de contaminação, verifica-se sistematicamente que os níveis de glicose são mais baixos nos pontos potencialmente contaminados. A partir desses resultados é possível sugerir que os contaminantes aos quais os espécimes estão submetidos induzem a um maior consumo energético, resultando na queda dos níveis glicêmicos circulantes.

As médias de alguns resultados apresentaram valores inferiores aos do desvio padrão, o que pode estar associado a presença de amostras anômalas (outliers) ou número de amostras inferior ao necessário. Assim, análises estatísticas posteriores deverão ser realizadas para refinamento do conjunto de dados.

No que se refere aos valores totais de proteínas na hemolinfa, os pontos Candeias, Pitinga, Aratuípe e Acupe mostraram valores próximos com uma média de 146,1 mg/ml. Posteriormente, os locais Jaguaripe e São Roque, com uma concentração média de 111,2 mg/ml. Os espécimes coletados em Ponta Grossa, tiveram uma média de 85,4 mg/ml de proteínas na hemolinfa. Saubara e Caixa Prego, apresentaram valores próximos com uma média de 59,0 mg/ml. Maragogipe, por sua vez, teve a menor concentração, revelando uma média de 34,2 mg/ml.

Os níveis de proteína na hemolinfa desses animais, geralmente variam em seu ciclo de muda. Essa concentração pode atingir níveis mais altos antes da ecdise, e por sua vez níveis mais baixos depois da troca do exoesqueleto. (Depledge \& Bjerregaard, 1989). Por isso em animais jovens a concentração de proteína na hemolinfa pode apresentar bastante variação, o que pode ter acontecido nesse estudo, uma vez que não foi levada em consideração a fase de desenvolvimento do animal. Ao contrário da proteína, a glicose, independentemente da fase de desenvolvimento se mantém razoavelmente estável, devido a hormônios que modulam sua concentração (Verri et al, 2001).

De forma análoga à comparação entre pontos potencialmente contaminados com pontos controle realizada anteriormente, para os níveis proteicos na hemolinfa dos animais o padrão mais freqüentemente observado apresenta níveis mais elevados de proteínas em animais de pontos contaminados quando comparados aos pontos controle da mesma bacia hidrográfica. Considerando que a exposição a contaminantes ambientais pode induzir a produção de proteínas de proteção, como as metalotioneínas na defesa a metais tóxicos, o aumento dos níveis proteicos totais na hemolinfa de animais em pontos contaminados é compatível com as respostas fisiológicas esperadas para estes espécimes.

4. Considerações finais

Esse estudo apresentou dados finais que foram obtidos a partir de coletas realizadas na época de estiagem, são necessários novos estudos durante o período chuvoso para avaliar os impactos da sazonalidade nos indicadores bioquímicos desses animais.

Com base nos resultados, pode-se inferir que em algumas das regiões da BTS ocorrem modulações dos níveis de glicose na hemolinfa, que podem ser decorrentes de contaminação no ambiente. Todavia, é necessário que além dos níveis de glicose e proteína na hemolinfa sejam observados outros parâmetros para uma melhor avaliação.

5. Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), pelo apoio financeiro. A Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, pelo apoio em estrutura e deslocamento.

Referências bibliográficas

DEPLEDGE, MH., P. 1989. Haemolymph protein composition and copper levels in decapod crustaceans. Helg Meeresunt 43: 207-223.

PINHEIRO, M. A. A. et al. Accumulation of six metals in the mangrove crab Ucides cordatus (Crustacea: Ucididae) and its food source, the red mangrove Rhizophora mangle (Angiosperma: Rhizophoraceae). Ecotoxicology and Environmental Safety, v. 81, p. 114-121, 2012.

RIOS, M. C. et al. 2017. Capability of Paraguaçu estuary (Todos os Santos Bay, Brazil) to form oil--SPM aggregates (OSA) and their ecotoxicological effects on pelagic and benthic organisms. Marine Pollution Bulletin, v. 114, n. 1, p. 364--371.

VERRI, T. et al. 2001. D-glucose transport in decapod crustacean hepatopancreas. Comp. Biochem. Phys. A 130, 585-606.


  1. Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Bacharel em Saúde e graduanda em Medicina (UFRB). Email: danandrade10@hotmail.com

  2. Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Doutor em Química Analítica (UFBA) e professor associado II (UFRB). Email: fabiojackslater@yahoo.com.br

  3. Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Bacharel em Saúde e graduanda em Medicina (UFRB). Email: luanasoares8198@gmail.com

  4. Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Doutor em Biologia Comparada pela Universidade Estadual de Maringá, e professor Adjunto A (UFRB). Email: marcelobiondaro@gmail.com

  5. Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Doutora em Ciências Biológicas pelo Eberhard Karls Universität Tübingen, Alemanha e professora associada (UFRB). Email: sibele.tozetto@gmail.com

  6. Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Bacharel em Saúde e graduanda em Medicina (UFRB). Email: tainalima95@hotmail.com